Sua opinião pode estar errada: uma análise sobre fatos e opiniões na pandemia

Gabrielly de Paula

O que é opinião e o que é fato? A diferença nem sempre fica clara, e isso tem motivo: uma opinião deve ser baseada em fatos, então apresentar os dois em um mesmo texto gera a confusão. 

A diferença mais óbvia é que os fatos são verificáveis, ou seja, um fato pode ser comprovado a partir de dados da realidade e observação. A opinião é pessoal, pode ser construída ao longo do tempo, ser aprimorada ou mudar completamente.  Na mídia, as coisas podem se misturar às vezes, e isso não é um problema! Editoriais, artigos de opinião, resenhas e outros gêneros textuais são formas importantes de divulgar pontos de vista discordantes entre si. Porém, são gêneros diferentes de notícias ou reportagens que, de fato, são retratos da realidade e devem se ater aos acontecimentos reais. Entender o gênero do que você está lendo é essencial para saber se é fato ou não. 

Vamos observar um exemplo: 


Reprodução Jornal Nacional, G1 Globo.

Nessa notícia são apresentados dados coletados através de pesquisa e levantamento de informações. O intuito é informar através da divulgação de fatos relevantes para a pandemia, podendo ajudar no seu controle. Esses fatos não abrem espaço para concordância ou discordância, eles existem independente disso.

Reprodução Portal Terra.

Nesse outro caso, o autor do texto vai usar fatos , mas para provar uma opinião específica. Esses mesmos fatos podem gerar opiniões diferentes: você pode discordar de que a COVID-19 é a “crise de saúde que define nosso tempo”, mas não pode discordar de que a COVID-19 é uma crise de saúde.

Na notícia apresentada, o título já deixa claro que se trata de uma opinião. Mas como identificar se não estiver assim? Primeiramente, fatos tem fontes, e essas fontes podem ser verificadas. Já as opiniões, uma vez que são marcadas pela subjetividade – pois são individuais -, podem ser entendidas através do uso de adjetivos , palavras que dão características aos seres. Bom, ruim, bonito, feio, maior, menor, relevante ou irrelevante: esses são termos que definem qualidades com as quais se pode concordar ou discordar.  

Uma vez entendido a diferença entre fato e opinião, vamos entender como uma opinião pode estar errada.

Existe uma certa dificuldade em falar sobre opiniões sem cair no mito de que não se discute isso. Acaba-se, assim, tornando opiniões que estão erradas tão válidas quanto aquelas que estão totalmente embasadas em fatos verificáveis. Muito dessa dificuldade pode ser explicada por um conceito, a pós-verdade.

A pós-verdade é definida como situações em que os fatos são menos relevantes do que os sentimentos para a construção da opinião. Esse conceito está fortemente relacionado às fake news, já que a propagação delas se dá pois as pessoas acreditam naquilo que querem acreditar, naquilo que condiz com o que elas já acreditam. Fake news é uma questão de vontade de acreditar, sendo uma representação clara de como a pós-verdade impacta a realidade. 

Tudo isso é prejudicial à sociedade em vários momentos, mas é crucial quando tratamos de uma pandemia. Nesse contexto, acreditar ou não nos fatos verificados pelo método científico pode ser caso de vida ou morte, afetando não só aqueles indivíduos que acreditam nas fake news, mas todos ao redor dele. A saúde é um pacto de cuidado coletivo , especialmente no contexto de um vírus, já que se faz necessário que todos sigam os protocolos de segurança para garantir o controle da disseminação da doença. Quando opiniões sem fundamentação científica se popularizam e esse pacto coletivo é quebrado por alguns, há risco para a sociedade como um todo. 

Um grande exemplo disso foi a cloroquina . Já havia sido comprovado, muitas vezes e através de muitas fontes, que esse medicamento não tinha utilidade na luta contra a COVID-19, mas o governo federal continuava indicando-o como tratamento precoce. Uma das justificativas, dada pelo exército, foi que o medicamento traria esperança, e essa é uma justificativa que nos remete à pós-verdade, uma vez que é mais fácil acreditar nesse sentimento positivo de que um remédio acessível combate o vírus do que ter que lidar com o peso – inclusive psicológico – que a pandemia de uma doença sem cura trás. Entretanto, é necessário lidar com isso com seriedade e respaldo científico para minimizar as consequências, mas essa necessidade de acreditar em uma cura milagrosa leva à desinformação.

Em resumo, uma opinião que é contrária aos fatos, baseada em sentimentos e moralismo ou que foi desmentida por pesquisas sérias é uma opinião errada. Isso não deve ser considerado válido ou ser tão levado em conta quanto declarações baseadas em experiência e pesquisa. Por isso, quando conseguimos ter senso crítico para entender as barreiras entre fato e opinião, além de entender o que está baseando as opiniões que ouvimos, combatemos a desinformação.